A artrite reactiva (antigamente chamada de Síndrome de Reiter) pertence à família das espondilartrites e é definida como uma artrite (inflamação das articulações) que ocorre entre dias a semanas após uma infecção bacteriana sobretudo gastrointestinal ou genito-urinária. É uma doença pouco comum que tipicamente ocorre em jovens adultos, afectando do mesmo modo homens e mulheres.

As infecções mais frequentemente reconhecidas como causadoras de artrite reactiva são:

– gastrointestinais por Salmonella, Shigella, Campylobacter, Yersinia, Clostridium difficile;

– genito-urinárias por bactérias como Chlamydia trachomatis;

– respiratórias por Chlamydia (ou Chlamydophila) pneumoniae.

Existem também casos reportados de infecções por Escherichia coli e por Mycobacterium bovis.

No caso das infecções urogenitais os sintomas mais comuns são a dor pélvica, o ardor ao urinar e um corrimento vaginal ou peniano tipo pus ou aquoso. Em alguns doentes com uretrite infecciosa a infecção pode não dar manifestações.

A diarreia é a manifestação mais característica das infecções gastrointestinais que podem causar artrite reactiva.

O intervalo de tempo entre a infecção e o início das manifestações da artrite reactiva é habitualmente de 1 a 4 semanas. Existem manifestações articulares e extra-articulares que são iguais quer a infecção prévia seja gastrointestinal quer seja genito-urinária.

Os sintomas de artrite são a dor e o inchaço das articulações. Normalmente as queixas envolvem um pequeno número de articulações (3 ou menos), sobretudo joelhos, tornozelos ou articulações do pé, embora as extremidades superiores, coluna vertebral e articulações sacroilíacas também possam ser afectadas.

Outros doentes podem sofrer de entesite (inflamação à volta do local de inserção de ligamentos e tendões no osso) que se manifesta por dor e inchaço nos tornozelos (tendão de Aquiles) ou planta dos pés (fáscia plantar).

Alguns doentes também podem desenvolver dor na coluna vertebral e dactilite, que tipicamente se apresenta com “dedos em salsicha”.

O envolvimento extra-articular na artrite reactiva associa-se com várias manifestações que podem estar presentes quer na fase aguda da doença quer na crónica: conjuntivite, úlceras orais, febre, mal-estar geral, dor de cabeça, perda de peso, lesões cutâneas (por exemplo na palma e planta dos pés, na glande peniana) e alterações das unhas.

A Síndrome de Reiter diz respeito apenas ao conjunto de manifestações compostas por uretrite, conjuntivite e artrite.

O diagnóstico é essencialmente clínico e envolve:

– presença de dor e inchaço de articulações normalmente nos membros inferiores, entesite, dactilite, dor na coluna vertebral ou manifestações extra-articulares já mencionadas anteriormente;

– evidência de uma infecção extra-articular prévia (diarreia, infecção genital ou urinária);

– ausência de outra causa mais provável para as manifestações.

A identificação da bactéria é útil nos casos de infecções genitais mas não é absolutamente necessária no caso das infecções gastro-intestinais. Existem testes urinários e genitais que podem por vezes detectar uma infecção por Chlamydia trachomatis. A análise das fezes pode por vezes confirmar a infecção por um dos microrganismos que causa artrite reactiva como Yersinia Salmonella.

Quando se retira líquido sinovial da articulação afectada, a sua análise permite excluir outras causas da artrite e o objectivo não é identificar a bactéria causadora do quadro, pois os microrganismos não são identificados nas articulações afectadas.

Os testes de sangue para identificar os microrganismos infecciosos normalmente não são utilizados, mas podem-se dosear os chamados anticorpos e os reagentes de fase aguda (proteína C reactiva e velocidade de sedimentação) que poderão estar elevados, assim como os leucócitos (glóbulos brancos).

O gene HLA-B27 é um factor de risco para o desenvolvimento desta doença, para a sua cronicidade e recorrência, mas isto não significa que todos os doentes com artrite reactiva tenham esse gene.

As radiografias das articulações afectadas podem ajudar a excluir outras causas de dor. Para o diagnóstico de artrite e entesite pode utilizar-se a ecografia e a ressonância magnética nuclear.

A utilização de antibióticos não tem como objectivo tratar especificamente a artrite, mas pode ser indicada para o tratamento de infecção génito-urinária activa. O doente e o seu parceiro sexual devem receber tratamento antibiótico para a infecção genital por Chlamydia trachomatis.

Também as infecções respiratórias por Chlamydia (ou Chlamydophilapneumoniae necessitam de tratamento antibiótico.

Os antibióticos não estão indicados nas infecções gastrointestinais não complicadas, mas podem ser usados em alguns casos específicos de doentes mais idosos, com doença grave ou com perturbações do sistema imunitário (de defesa).

Não existe evidência clínica de que a utilização de antibóticos promova a melhoria da dor articular ou o encurtamento da duração da doença (após a dor articular já se ter desenvolvido).

O tratamento da artrite passa pela utilização de agentes anti-inflamatórios e supressores do sistema imunitário em duas fases da doença: aguda e crónica. A maioria dos doentes vai ter uma doença autolimitada e vai precisar apenas de analgésicos e anti-inflamatórios não esteróides (como o ibuprofeno, naproxeno ou diclofenac) que são utilizados para reduzir a dor articular e o inchaço. Pode ser necessário utilizar regularmente doses elevadas por um período de até 2 semanas para ser poder avaliar a sua eficácia.

No caso de não haver melhoria pode haver necessidade de utilização de corticosteróides na forma de uma injecção na articulação, seguido ou não deste fármaco em comprimidos durante um curto período de tempo.

No caso de estas terapêuticas falharem, da doença ser grave, persistente ou recorrente, pode ser necessário recorrer a outros fármacos como a sulfassalazina, o metotrexato, a leflunomida ou a terapêutica biológica com agentes bloqueadores do factor de necrose tumoral (por exemplo: etanercept, infliximab, adalimumab) ou tocilizumab.

O tratamento das manifestações extra-articulares necessita de intervenções adicionais. Para os casos de inflamação ocular podem utilizar-se gotas oculares de corticosteróide. No caso de desenvolvimento de dor ocular ou alterações da visão a observação por Oftalmologista é imprescindível para um eventual diagnóstico de inflamação da íris (uveíte anterior). Pode utilizar-se corticosteróides tópicos para o tratamento de úlceras da mucosa oral, assim como para lesões cutâneas como pústulas, onde também se pode aplicar salicilatos tópicos, vitamina D tópica e retinóides.

A duração média da doença é de 3 a 5 meses. A maioria dos doentes melhora completamente sem lesão crónica da articulação ou têm manifestações muito ligeiras nos 6 a 12 meses após o início das manifestações, mas 15 a 20% podem ter uma apresentação mais crónica da doença. Noutros doentes a doença tem um curso intermitente.

Mesmo após a resolução da doença pode persistir alguma dor nas articulações, nas entesis e na coluna vertebral.

Alguns doentes com artrite reactiva crónica podem mais tarde evoluir com manifestações características de outras espondilartropatias (por exemplo: espondilite anquilosante, artrite psoriática).

A artrite reactiva não é uma doença contagiosa mas as infecções que a precedem são. Por exemplo, as infecções por Chlamydia trachomatis são prevenidas evitando-se relações sexuais desprotegidas.

Para prevenir as infecções gastro-intestinais, sobretudo em áreas endémicas para alguns dos microrganismos causadores de artrite reactiva, devem-se privilegiar os alimentos cozinhados e a água engarrafada.

Autor: Dr.ª Sofia Serra

Revisor: Dr. Walter Castelão