As espondilartrites são um grupo de doenças inflamatórias crónicas, que têm em comum um conjunto de características clínicas e genéticas. Estas doenças dividem-se, de acordo com o predomínio das manifestações clínicas, em espondilartrite axial (quando afecta sobretudo a coluna vertebral e as articulações sacroilíacas), espondilartrite periférica (quando predomina o envolvimento de outras articulações, sobretudo dos membros inferiores) ou na forma entesopática (quando as inserções dos ligamentos são a manifestação preponderante). Fazem parte deste grupo de doenças a espondilite anquilosante, a artrite psoriásica, a artrite associada à doença inflamatória do intestino (doença de Crohn ou colite ulcerosa), a artrite reactiva, entre outras formas. A noção actual do conceito de espondilartrite axial permite não só incluir os doentes com alterações das articulações sacroilíacas nas radiografias, mas também aqueles doentes com manifestações clínicas semelhantes, mas ainda sem alterações radiográficas – a chamada espondilartrite axial não radiográfica. Uma grande parte destes doentes apresenta alterações na ressonância magnética das sacroilíacas. Este novo conceito permite que o diagnóstico seja feito mais precocemente.

A causa destas doenças permanece desconhecida. Trata‐se de doenças que resultam de uma desregulação do sistema imunológico do organismo, sendo que os factores genéticos têm um papel preponderante, muito embora múltiplos factores ambientais possam contribuir para o desencadear da doença. A inflamação crónica é uma característica preponderante neste grupo de doenças, podendo as análises que detectam inflamação, como a proteína C-reactiva (PCR), estar alteradas. Contudo, a forma como a inflamação contribui para o dano das articulações permanece um assunto de debate entre a comunidade científica.

A presença de um marcador genético – o alelo HLA B27 – pode ser identificada em cerca de 90% dos doentes com espondilite anquilosante, sendo menos prevalente nas outras doenças deste grupo. Ainda assim, muitos indivíduos saudáveis são portadores deste alelo (cerca de 8% nos caucasianos), mas apenas uma minoria virá a apresentar doença, pelo que a sua presença não é suficiente para o diagnóstico.

As espondilartrites axiais surgem geralmente em jovens, entre os 20 e os 30 anos. Enquanto que a espondilite anquilosante é mais frequente no sexo masculino, a preponderância do género esbate-se na forma não radiográfica.

O sintoma cardinal das espondilartrites axiais é a dor na coluna lombar, dita de ritmo inflamatório. Esta dor surge tipicamente durante o repouso, condicionando despertares na segunda metade da noite. Ao acordar (ou após períodos de repouso), o doente sente rigidez, “prisão nos movimentos”, com duração geralmente superior a trinta minutos, referindo dificuldade, por exemplo, em dobrar‐se para calçar os sapatos. Com a continuação do movimento, a dor e a rigidez aliviam. A dor, por regra, apresenta boa resposta ao consumo de anti‐inflamatórios. Com a evolução da doença e o dano estrutural associado, surge a limitação da amplitude dos movimentos da coluna em todos os planos. O doente pode ter dificuldade em inclinar o tronco ou em virar o pescoço para olhar para trás, por exemplo. Tanto nas espondilartrites axiais como nas periféricas, outras articulações podem estar afectadas: os ombros, as ancas, os joelhos e as tibiotársicas (tornozelos) são os mais frequentemente atingidos quando há doença articular periférica.

A entesite, ou seja, a inflamação das enteses, que constituem os locais de inserção dos ligamentos nos ossos, é bastante característica das espondilartrites, podendo mesmo ser a sua primeira manifestação. As entesites mais comuns são a do tendão de Aquiles e as da fáscia plantar (membrana que envolve os músculos dos pés, existente na sua face plantar).

As espondilartrites podem ter outros tipos de envolvimento além do sistema musculoesquelético. O envolvimento mucocutâneo, traduzido por psoríase (lesões avermelhadas e descamativas, podendo também envolver as unhas), é uma faceta importante e frequente da constelação de manifestações associadas à doença. Outro órgão frequentemente atingido é o olho, sob a forma de uveíte anterior, que se manifesta por olho vermelho e doloroso geralmente unilateral, com visão turva. Para além do olho e da pele, pode também haver inflamação a nível intestinal. A insuficiência da válvula aórtica e a fibrose dos lobos pulmonares superiores são também mais frequentes entre estes doentes. A fadiga é uma queixa muito comum. A fadiga é uma queixa muito comum.

Não existem critérios de diagnóstico. Assim, o diagnóstico das espondilartrites é feito adaptando critérios de classificação, que são usados para incluir doentes em ensaios clínicos, imperando a decisão do médico para o diagnóstico definitivo. Estes critérios têm em consideração o conjunto de manifestações clínicas (dor lombar, artrite, uveíte, entesite), imagiológicas (radiografia e ressonância magnética das sacroilíacas) e laboratoriais (HLA B27, PCR) previamente descritas.

O tratamento da doença depende do tipo de envolvimento.

Nos doentes com espondilartrite axial, a prática de atividade física adequada (como natação e hidroginástica) e fisioterapia assumem uma importância fulcral, no sentido de preservar a mobilidade e uma correcta postura.

No caso do envolvimento axial, isto é, da coluna, o tratamento farmacológico baseia‐se em anti‐inflamatórios não esteróides. Estes foram, efetivamente, os únicos fármacos que até hoje mostraram eficácia em retardar os danos estruturais.

No caso do envolvimento periférico, o tratamento farmacológico assenta no recurso a fármacos como a sulfassalazina (Salazopirina®), o metotrexato (Ledertrexato®), a leflunomida (Arava®) e as infiltrações articulares com corticóides.

Os chamados fármacos biológicos – dirigidos contra moléculas intervenientes no processo inflamatório – surgem como uma alternativa nos doentes que, apesar das terapêuticas atrás descritas, mantém grande actividade da doença.

Presentemente, existem, no nosso país, cinco fármacos biológicos aprovados no tratamento da espondilartrite axial – todos eles dirigidos contra uma molécula fundamental no processo patológico, designada factor de necrose tumoral alfa (TNFα). Estes fármacos demonstraram eficácia na redução da inflamação – quer a nível das articulações sacro-ilíacas e coluna vertebral, quer a nível das articulações periféricas e enteses, bem como no controlo das manifestações extra-articulares. A sua segurança foi também amplamente demonstrada, sempre que contempladas as devidas recomendações.

Vários ensaios clínicos estão a decorrer e espera-se que, em breve, novos fármacos biológicos, com outros mecanismos de acção, venham a enriquecer o arsenal terapêutico nas espondilartrites axiais.

A doença pode ter uma evolução mais branda ou mais agressiva: cada doente é diferente. As espondilartrites podem ter uma evolução lenta ou, por outro lado, uma progressão rápida do dano estrutural, com fusão das articulações sacroilíacas (as chamadas “sacroilíacas fantasma”) e com formação de pontes ósseas entre as vértebras, podendo a longo prazo levar à chamada “coluna em bambu”, com perda severa da mobilidade. Por vezes, as coxofemorais – articulações das ancas – e os ombros são também severamente afetados, condicionando uma artrose precoce e uma diminuição marcada da amplitude dos movimentos.

Não é uma doença contagiosa.

Quanto à transmissão à descendência, os indivíduos com familiares em primeiro grau com espondilartrites apresentam maior risco de desenvolver a doença – influenciado grandemente pela predisposição associada à presença do alelo HLA B27. Todavia, o risco de um familiar do primeiro grau de um indivíduo com espondilartrite vir a apresentar também a doença permanece relativamente baixo – inferior a 10%.

Não é possível prevenir o surgimento de uma espondilartrite, pelo que o diagnóstico precoce é muito importante. Caso apresente algumas das queixas/sintomas explicados anteriormente deverá consultar o seu médico de família para que este possa enviá-lo para o Serviço de Reumatologia do hospital da sua área de residência (referenciação). A referenciação, visando um diagnóstico rápido e início de tratamento adequado, é essencial. No caso da espondilite anquilosante e da espondilartrite axial não radiográfica, além do tratamento farmacológico, a prática de actividade física é fulcral, no sentido de preservar a mobilidade e prevenir a perda funcional.

Autores: Dr.ª Renata Aguiar, Dr. Alexandre Sepriano

Revisores: Dr.ª Anabela Barcelos, Professor Doutor Fernando Pimentel